Por Alice Coutinho | 3FN1 FTD 2022-2
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(Alice) Primeiramente gostaria de saber um pouco mais de você. Qual o seu nome, idade, de onde veio, sua formação etc.?
(Sarah) Meu nome é Sarah Ferreira, estou com 32 anos, trabalho com fotografia fazem 10 anos, mas acho que vai fazer um pouco mais, porque eu acho que falo que fazem 10 anos fazem uns 2 ou 3 anos. Então acho que já devem fazer uns 11 ou 12 anos já. Sou de São Paulo capital, sempre morei aqui. A minha primeira formação foi na Anhembi Morumbi, fiz pelo Prouni, eu fiz produção musical – produção fonográfica que eles chamavam lá. Quando eu fui me inscrever lá pro ENEM, no Prouni, você tinha que colocar a primeira e a segunda opção, e eu vi fotografia e falei ‘Hm se pá, né!?’, porque eu estava meio perdida do que eu ia fazer, só que eu estava focada em produção, então eu coloquei produção em primeiro e fotografia em segundo e acabei conseguindo para produção mesmo e fiz o curso.
No último semestre nós tivemos uma matéria com o pessoal de outro curso, interdisciplinar, com o pessoal de fotografia, e era uma menina só de fotografia e três de produção musical; a gente tinha que fazer um stop motion – a gente ia criar a trilha sonora e ela ia criar a parte do stop motion. Acabou que ela não fez muita coisa e eu acabei tomando conta da parte da fotografia, e isso foi o que despertou um negocinho ali, né!?
Eu falei ‘Tá, eu acho que talvez eu tenha errado o curso, talvez eu tenha desperdiçado uma bolsa de 100%’. Quando acabou o curso, eu não consegui seguir na área de produção, área muito cara – não que fotografia não seja – mas é uma área muito cara, precisa ter muitos contatos para conseguir seguir, então eu acabei indo para a fotografia e comecei a aprender sozinha mesmo, vendo muito vídeo no YouTube, era bem o começo do YouTube na época, quando ele estava começando a bombar. Nele tinha um canal específico que tinha muito conteúdo só que era em inglês, minha sorte é que eu tinha aprendido inglês na marra e sozinha, tive uma facilidade muito grande para aprender – com música, filme – e aí eu fui aprendendo e peguei esse canal e fiquei destrinchando. Na época eu trabalhava em uns trabalhos X para me manter e quando eu estava sem nada para fazer, eu ficava vendo vídeo desse canal e pesquisando.
Nos primeiros 1 ou 2 anos eu fui aprendendo assim, na marra, depois eu decidi comprar a minha câmera, aí eu precisava de – se não me engano foi R$ 1.000,00 a câmera – e eu juntei dinheiro e dei um jeito de comprar e faltavam, sei lá, R$100,00 para eu conseguir juntar e eu fui pedir pro meu pai, e a gente era família de classe média baixa, não tínhamos dinheiro para esse tipo de coisa. E só pedir R$ 100,00 pro meu pai foi ‘Meu Deus’, estou pedindo dinheiro demais. Mas ainda bem, deu, deu certo e eu comecei a fazer algumas fotos. Depois disso eu fui fazer faculdade na FMU, eram R$ 500,00 a mensalidade e era o que dava para pagar – ganhava R$ 700,00 e pagava R$ 500,00 na faculdade. Fiz fotografia na FMU e, depois de lá, fiz uns cursos. Fiz Fotografia Básica no SENAC e depois, mais já recente, fiz na Belas Artes de Produção e Edição de Videoclipe, e no meio do caminho uns workshops aqui, uns negócios ali – disse que ia falar pouco e acabei falando pra caramba.”
(S) Eu não sei, porque eu sempre divido o trabalho em comercial – trabalho que eu faço para ganhar dinheiro, para conseguir me manter – e trabalho autoral, que é mais ‘artístico’, entre muitas aspas. Tinha até uma professora minha que – depois que eu a vi falando isso eu fiquei meio assim de usar esse termo ‘autoral’ – falava que toda foto é autoral, até as fotos comerciais que você faz são autorais, mas as fotos ‘autorais’ são as fotos de rua que eu faço, então não é uma foto que vai me render dinheiro, necessariamente.
Gostaria que, mas enfim. Mas teve um projeto em específico que a menina estava gravando um EP em casa, sozinha, e me chamou para fazer a arte desse EP, para poder lançar no Spotify e tudo. Ela falou que queria fazer comigo porque o ‘meu olhar’ – por mais que eu odeie esse termo – ia passar o que ela queria passar no projeto, e aí foi muito legal fazer, porque como ela gravou sozinha tudo em casa durante a quarentena, a gente fez no quarto dela, ficou tudo confinado no quarto dela e a gente fez um monte de foto digital e analógica e uns vídeos curtinhos para, sabe quando você toca uma música no Spotify e aparece um videozinho? A gente fez uns videozinhos para fazer isso. Só que ela não lançou, vai fazer um ano, foi em janeiro e ela ia lançar em fevereiro e ela achou que o projeto não estava legal o suficiente e não lançou.
Depois ela ameaçou lançar tem uns 2 ou 3 meses e ela não lançou de novo. Então é um projeto que eu até coloquei lá no meu Behance, de umas fotos analógicas que eu fiz, mas foi algo que eu fiquei muito feliz de ser chamada, de ser considerada para fazer, porque eu fico meio brava porque em 10 anos de fotografia nenhuma foto minha foi usada de capa de disco, porque eu sinto que tem muita foto que daria uma capa de disco – tem muita coisa melancólica, muita coisa que daria uma capa indie, essas coisas – e nunca aconteceu, e agora que que ia acontecer, a menina não lançou.
Mas quem sabe sai em algum momento. Mas tinha ficado super legal, a gente tinha feito umas pirações que ela grudou umas baratas de borracha nela e a gente fez uns negócios meio doidos, enfim; o quarto dela tinha muita boneca, muita pelúcia uns bonequinhos com cabelinho – uns trolls –, umas coisas bem piradas. O material ficou muito legal, eu fico triste de nunca ter saído.”
(S) A grande maioria que eu tenho feito nos últimos anos é foto para TCC de moda principalmente. É até um gancho, porque eu estou trabalhando em uma faculdade que muitos alunos acabam me chamando para fazer o TCC, as fotos da coleção, o vídeo da coleção. Porque, fora isso, eu faço muito foto de produto, produto para site, que já é uma coisa mais mecânica, mais chatinha – um produto num fundo branco e é isso – que dá um dinheirinho, mas você não tem muito o que pirar e fazer. E normalmente as pessoas vêm com uma ideia, já têm um projeto em mente, principalmente quando é coleção de moda assim, tem que fazer uma pesquisa muito grande antes de sequer iniciar a coleção.
Então as pessoas, normalmente, já chegam com a ideia esboçada, e o que eu faço é ouvir e ver onde isso é viável, o que dá para ser feito e o que não dá – porque as vezes as pessoas são muito megalomaníacas e querem fazer coisas que não são possíveis com o pouco orçamento que têm. Então é servir também de filtro, de pegar as ideias e saber tirá-las do campo das ideias e trazer pro material. Eu queria fazer mais projetos autorais nesse sentido também. Teve uma época em que eu participei de um coletivo de fotojornalismo e a gente fazia vídeos, era uma coisa mais jornalística mesmo, e eu queria fazer alguma coisa com música, sabe!? É uma coisa que me frusta bastante.
O meu começo, eu comecei a fotografar em show. Depois de um tempo eu fui perdendo a vontade e teve uma época em que eu perdi o tesão por fotografia, porque, justamente, eu estava trabalhando só fazendo foto de produto e é um trampo chato, como se fosse de escritório – 90% do tempo você fica na frente do computador editando fundo branco de foto. Mas eu queria fazer mais projetos de música, porque o que me falta ultimamente o que me falta é dinheiro para colocar essas coisas pra frente e tempo de disposição para poder fazer. Mas a vontade está aí.”
(S) No início eu utilizava câmera analógica, da minha mãe, roubei ela pra mim e fui fotografando. Depois de um tempo eu perdi a vontade tanto de foto normal pra analógica e, nos últimos 4 anos, foi voltando a vontade de fotografar nos dois sentidos. E o analógico, hoje, é 90% do que eu faço, e a parte ruim é que está tudo caro – tanto que até dei uma diminuída no ritmo porque no último semestre desse ano eu devo ter fotografado uns 20 rolos, e isso vai muito dinheiro. Tinha vezes que eu deixava para revelar lá no laboratório 4 filmes de uma vez em uma semana.
O fato de eu ter começado a namorar um fotógrafo que também fotografa em analógico, e a gente sai junto e tira um monte de foto, acabou virando uma montanha de filme para revelar – inclusive estou com em casa 4 filmes para revelar, estou com mais um na câmera e, se eu não revelar, vai virar uma bola de neve. Mas o que eu tenho tentado fazer nos últimos anos é ir introduzindo o analógico nos trabalhos comerciais, porque o que ele tem sido nos últimos tempos, tem sido minha forma de me expressar, de tirar umas fotos que são mais artísticas e, nos últimos trabalhos que eu fiz, eu estou procurando inserir isso ‘Olha, eu posso fazer no analógico e tal’.
E eu estou tendo sorte de as pessoas estarem dispostas a fazer e confiam em fazer. Inclusive essa menina do EP que não saiu, nós tivemos uma conversa dessas, por videochamada para falar sobre o projeto, e eu falei que podíamos fazer algumas analógicas, que eu achava que ia ficar legal, super na estética das coisas que eu estava querendo, e ela falou que não gostava de analógica e que, na grande maioria das vezes que ela vê, é tudo fora de foco, tudo quadrado, mas que as minhas ela sabia que iam ficar boas, que ela sabia que eu ia criar direito.”
(A) Dessas áreas que foram citadas, qual é a sua favorita? Xodó mesmo?
(S) O que eu gosto e queria voltar a trabalhar mesmo é com shows. A questão de trabalhar com fotografia é que é uma profissão ingrata em vários sentidos: não paga bem, não é valorizada. Eu quero muito a fotografar show, mas eu não queria perder meu fim de semana, meu sábado, minha sexta-feira. Então eu acho que vou voltar a fazer por hobby mesmo, não vou acabar trabalhando de fato com isso, porque se eu for trabalhar, virar fotógrafa de show mesmo, eu não tenho vida, e eu quero ter a minha vidinha, ficar em casa no sábado vendo série.
Eu acho que foto de moda tem sido algo que é um meio termo: consigo ter um pouquinho de liberdade artística e conseguir ter um ganha-pão, juntar algum dinheiro, pagar algumas contas. Mas acho que o xodó mesmo é show.” Além de agências para fotografar para shows, a fotógrafa também trabalhou para e-commerce, para sites de venda de sapatos, produtos esportivos, freela de outro site de sapatos e, atualmente, auxiliando professores e alunos a utilizarem os equipamentos de fotografia e o espaço do estúdio fotográfico da IED (Instituto Europeu de Design), em São Paulo.
(A) Qual é a sua visão da fotografia atualmente e o futuro que ela terá, assim como a profissão?
Essa galera hypada que está fazendo foto para Vogue sempre, é uma porcentagem muito pequena. Só que eu acho que talvez seja pelo ambiente em que eu esteja aqui também, de jovens ricos, que eles acham realmente que é muito fácil. Eu já ouvi de alguns alunos aqui ‘Por que você não larga aqui e vai viver de freela?’ gente, é porque não tem freela o tempo todo, tem mês que não entra freela e eu tenho que passar o mês, pagar meu aluguel, eu moro sozinha, então eu não posso largar meu CLT. Mas, ao mesmo tempo, está cada vez mais difundido, mais gente interessada, não só no analógico por causa desse comeback que está rolando.
E eu tenho muita curiosidade de ver o que que essa geração TikTok e parara vai criar no audiovisual. Porque é impressionante o nível de edição que tem uma galera que faz, tem umas coisas absurdas, que não são só da ferramenta. A ferramenta facilita muito, mas tem coisa que não é só dela, tem coisa que é criatividade, saber trabalhar com ângulo, ponto de vista, rapidez de edição, tudo. Então eu tenho muita curiosidade, daqui a 5 e 10 anos, o que essa galera vai produzir, que tem muito potencial. E uma das melhores partes de tudo isso é que pode despertar em muita gente. Se não fosse por TikTok, Reels, o que seja, talvez a pessoa não teria descoberto que ela tem uma afinidade pra isso, essa veia, essa facilidade, esse dom.
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