“O Brasil tem o hábito de colocar tudo em dois polos”

Por José Lucas Sena/AES

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, menos de 5% dos jovens, de 16 e 17 anos, votaram nas eleições de 2020 – uma queda de mais de 50% se comparado a 2016. Em contrapartida, nas manifestações realizadas em 2013 até às atuais – pró e contra governo – sempre vemos jovens engajados na luta. Essa participação mais atuante, muda o cenário político, de fato? Será que os jovens estão mais influentes na política? Quem vai tentar nos ajudar a entender essa questão é Fabrício Lopes. Cubatense de nascimento, já foi Coordenador de Politicas Transversais na Secretaria Nacional de Juventude da Secretaria Geral da Presidência da República; já ocupou a função de editor do Infojovem – Portal de Informação Juvenil, além de ter sido Secretário Geral do Conselho de Juventude de São Vicente. Por fim, integrou os quadros da Universidade da Juventude – UNIJUV. Atualmente, ele é secretário de turismo de Cubatão.

Desde 2013, vemos um crescimento do interesse das pessoas pela política e grande parte dos interessados são jovens e adolescentes. O que você acha desse crescimento no interesse?

Bom, é importante ressaltar que a gente vive novos tempos, não é a gente, tem aí hoje um instrumento da internet que possibilita uma comunicação mais rápida. Os mecanismos de busca ajudam muito as pessoas a conhecerem temas que elas não conheciam, e eu acho que isso de certa forma influenciou as pessoas a externalizarem, inclusive, opiniões que muitas vezes elas tinham, mas ficavam restritas aos amigos e ao círculo familiar. Então, nesse contexto, eu acredito que agora temos instrumentos para qualificar e quantificar essa participação política.

Você acredita que o interesse é genuíno ou vem por influência de alguns grupos específicos?

Não acho que exista influência. O que eu acho é que alguns grupos determinados se utilizam dessas novas movimentações para atrair pessoas, mas tem muita gente também que atua de forma independente e pretende atuar na política, seja para fazer o bem pela sociedade ou para disseminar o caos.

Dizem que “Política, futebol e religião não se discute”. Esses assuntos aparecem nas nossas conversas diárias, além do conteúdo nas redes sociais. É correto afirmar que a pluralidade de formas de se informar ajudou na conscientização política ou ela só piorou?

Eu penso da seguinte maneira, tanto futebol, religião quanto política não se tratam só de discutir o assunto. Porque a gente trata um discutir como obrigatoriamente, convencimento. Eu acho que a gente tem que é debater o assunto de uma forma a expandir o conhecimento, não necessariamente convencer as pessoas das nossas ideias. Seja no futebol, na religião e na política, a troca de informações é essencial; sobretudo na política, porque ela determina os caminhos da nossa da nossa cidade, do nosso estado, do nosso país. Ela determina o preço do arroz, do feijão, do combustível. Então quanto mais participação política a gente tiver, mais conseguiremos compreender como é formada a nossa economia, compreender quem realmente faz o bem pela sociedade. A gente precisa qualificar a política e fazer com que ela seja um espaço de todos e não de uma minoria como acontece hoje. Eu acredito que assim são assuntos que devem ser colocados em pauta. Acho que os espaços acadêmicos são de extrema importância para que a gente levante esses assuntos e, a partir dali, possamos construir novas ideias e de preferência, construir políticas públicas para que a gente possa implementar essas políticas públicas e criar um estado de bem-estar social para o povo brasileiro.

As redes sociais se tornaram o “novo” Ibope, onde podemos medir o apoio ou detrimento de um candidato e vimos, nas últimas eleições presidenciais que ela foi usada, para o bem, no sentido de divulgar as campanhas políticas, mas também, de forma maléfica, na divulgação de fake news. Como um jovem, adolescente, que de repente se vê cheio de pessoas e pseudocientistas políticos ao seu redor, pode se cercear de conteúdos verdadeiros, sem ideologias para A ou B e sem notícias mentirosas por trás?

Eu acredito, sobretudo, que a informação de credibilidade e de qualidade é essencial. Eu também vejo que é necessário que nós possamos é requalificar os instrumentos de comunicação, tendo em vista que hoje parece que qualquer foto já gera uma certa discussão; qualquer ponto de vista parece que é divergente. Então eu penso que, se a gente conseguir expor mais essas informações, dar mais condições das pessoas terem acesso à internet, porque muitas vezes é até difícil de algumas pessoas conseguirem correr atrás. Se a gente puder ter um instrumento de acesso para que essas pessoas possam pesquisar mais, se aprofundar mais nos assuntos e ter veículos de qualidade comprometidos realmente com a verdade das informações, isso é essencial para que a gente possa fortalecer a nossa democracia e ampliar também. Isso aí é um escopo de participação da sociedade.

A politização, hoje, em meio a tanta desinformação e ódio por A ou B é uma arma contra a própria política ou você acredita que, apesar dos pesares, a política consegue se sobressair em meio a tanto limbo?

Eu vejo o seguinte, existe um fator cultural. E esse fator cultural precisa ser interpretado por todos nós porque existe um hábito no Brasil de sempre tentar colocar dois polos. Qualquer discussão que seja é assim, mas nem todas as discussões se limitam a apenas dois polos. Então é importante que a gente ouça mais, que possamos ir pelo hábito de escutar mais, entender que isso não é prejudicial ao contexto democrático. É muito melhor ter mais pluralidade de ideias e outra, as forças das ideologias políticas eu acho que, muitas vezes, propõem chegar ao mesmo lugar, porém o caminho adotado para chegar nesses mesmos lugares é o diferencial. Contudo, o objetivo maior é o mesmo. A gente pode ver: nenhuma força política propõe a deseducação do país. Todas elas propõem qualidade da educação, mas a questão é a metodologia de como atingir essa qualidade da educação: Alguns acham que é fortalecer a educação pública. Outros acham que é privatizando a educação outros acham que eu fico com a educação militar o que nós precisamos é que essa pluralidade de ideias. É criar um ponto de convergência e que todas as ideias de certa maneira se sintam contemplados para a gente saber qual é o modelo e não acredito que seja só um modelo que vai dar certo eu acho que para cada localidade do Brasil inclusive a gente pode ter um modelo diferente pode também pensar nessa grandeza.

O debate político pode ser feito por “cidadãos comuns”, pessoas sem conhecimento teórico de política e baseadas em experiências ou é necessário ter alguém, no debate, que tenha noção teórica do que é a política?

Eu acho que o debate tem que ser feito por todas as pessoas. As experiências das pessoas são a essência da política, porque a política, sobretudo, é construir consensos e os consensos vão vir a partir das experiências que essas pessoas vivem. Eu acredito que é necessário que a gente una as ideias dessas pessoas e, dessa forma, consigamos a partir disso estimular que ela se aprofunda. Não é sobre aqueles que estudaram e puderam estudar política, até porque conhecimento não ocupa espaço, sempre ressaltando que isso faz parte do processo democrático em que a gente tem que respeitar a opinião do amiguinho e da amiguinha. Então eu penso que quanto mais pessoas trouxeram sua experiência, melhor para o processo político.

Como você vê o futuro do jovem na política? Acredita que ele vai se filiar a partidos e tentar mudar de dentro para fora ou ele vai tentar começar a mudança em casa, depois com os amigos e assim, crescendo até chegar na discussão ampla, na sua cidade e estado?

O Brasil é um país gigante. Então, dentro de um mesmo estado, numa mesma região, a gente convive com situações totalmente distintas. Assim, em alguns lugares vai ser muito mais fácil um jovem começar a participar da vida política, ingressando no partido porque as organizações nas cidades médias e nas cidades grandes, as grandes ações políticas e partidárias não é que estejam mais organizadas, mas tenham mais visibilidade e esse seja um caminho. Já nas cidades menores, talvez o contexto familiar, contexto escolar seja ainda mais importante para participação para a efetivação da participação dessas pessoas no cenário político, mas o importante como sempre é poder participar.

Como fazer o jovem ou adolescente acreditar que a política é um meio de mudar a sua realidade, a realidade do seu dia a dia?

Principal maneira da gente fazer as pessoas acreditarem que a política é o espaço de transformação, é a gente apresentando o quão grande foram os avanços provenientes das decisões políticas que foram tomadas ao longo da história. Geralmente, a gente costuma associar as decisões políticas as eleições e elas não estão associadas nem as eleições e nem a mandatos. Muitas vezes, as decisões políticas estão associadas a um conjunto de fatores. Veja você: nós tivemos no Brasil o movimento das Diretas Já, que reuniu vários interlocutores de diversas ideologias políticas em torno de um objetivo comum, que era abrir o país de novo para viver o processo democrático. Ou seja, ali não foi uma decisão política, foi uma ação política de diversos agentes políticos. Uma ação política transformara aquilo num grande movimento e mudaram os rumos da história do nosso País. Hoje a gente tem a possibilidade de ir às urnas. Votar é fazer com que os nossos direitos prevaleçam e a gente tem que agradecer a esses grandes movimentos da política. Por isso que eu acho que é importante a gente ressaltar esse e outros grandes momentos, onde a política prevaleceu e não uma votação no Congresso e não uma eleição, uma disputa eleitoral.