Perfil Fotógrafos | Claudia Andujar

Perfil Biográfico Fotógrafos | Claudia Andujar
Por Vitória Cardoso | 3FM2-4FM1 FTI 2023-1
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Naturalizada brasileira, Claudia nasceu em Neuchâtel no ano de 1931, na Suíça, filha única de Germaine Guye, uma preceptora suíça protestante, e de Siegfried Haas, um engenheiro húngaro judeu, passou a infância em Oradea, na fronteira entre Romênia e a Hungria, onde vivia sua família por parte de pai, de origem judaica. Se separaram quando Claudia tinha 8 anos. Ela fica com opai e, depois, é internada num convento católico. Em 1944, com a perseguição aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial, seu pai é levado para o campo de concentração de Dachau, onde acaba falecendo. No mesmo período, o convento onde Claudia morava, é fechado. Ela vai morar com a mãe, que então mantinha um relacionamento com um policial militar ligado aos nazistas, o que significava certa garantia de segurança para as duas, principalmente para Claudia, considerada judia. Em março de 1944, o território húngaro foi ocupado pela Alemanha.

No final do mesmo ano, agora na eminenciada ofensiva de Budapeste e invasão da Hungria pelo Exército Vermelho, Germaine Guye decide deixar o país. Com muita dificuldade, fugiu com a mãe para a Suíça e depois imigrou para os Estados Unidos, a convite do seu tio paterno, onde foi morar com ele em Nova York em 1948.Em Nova York estudou Humanidades no Hunter College, à noite, pois precisava trabalhar para viver, mas não conseguiu concluir os estudos. Foi vendedora de roupas femininas na Macy’s, trabalhou num escritório e foi guia de visitantes nas Nações Unidas. “Me empregaram porque eu falava várias línguas: húngaro, alemão, francês e inglês.” No Hunter, conheceu Julio Andujar, um refugiado da Guerra Civil Espanhola, com quem se casar logo no ano seguinte, aos dezoito anos.

Poucos meses depois do casamento, Julio se apresentou como voluntário para ir à Guerra da Coreia (1950-1953), esperando ser posteriormente recompensado com a cidadania americana. Júlio ficou três anos em combate e Claudia não o perdoou: “Fiquei furiosa quando ele se alistou, não queria recomeçar a vida com guerras. Nunca voltamos a viver juntos. Quando ele voltou, nos separamos”. Foi nessa época que Claudine se tornou Claudia, onde ficou com o sobrenome do primeiro marido: “Por tudo que aconteceu, quis eliminar meu nome de infância, Claudine Haas. Queria começar uma vida nova. “Em 1955 veio para o Brasil para reencontrar sua mãe em São Paulo e decidiu-se estabelecer no país onde deu início à carreira de fotógrafa, se naturalizando brasileira em 1976.Sem saber falar português, Claudia transformou a fotografia em instrumento de trabalho e de contato com o país.

Ao longo das décadas seguintes percorreu o Brasil e colaborou com revistas nacionais e internacionais, como Life, Aperture, Look, Cláudia, Quatro Rodas e Setenta, também lecionou fotografia em vários cursos, entre eles o do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp). Na década de 1970, compõe a equipe de fotógrafos da Realidade e Em outubro de 2015, o Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro apresentou a exposição Claudia Andujar: no lugar do outro, uma realiza ampla reportagem sobre a Amazônia. Nessa época, recebeu bolsa da Fundação Guggenheim e posteriormente, da Fundação de Amparo à Pesquisado Estado de São Paulo (Fapesp) para estudar os índios Yanomami. Essa viagem representou o grande divisor de águas em sua carreira e em sua vida. No intuito de se aprofundar no entendimento dessa cultura, Claudia decidiu então abandonar São Paulo e o  fotojornalismo, indo viver entre Roraima e Amazonas em tempo integral. Permaneceu na tribo durante cinco anos. A observação do modo de vida e das tradições Yanomami tem sidoo fio condutor de sua atividade como fotógrafa desde então.

Em 1978, após ser enquadrada na lei de Segurança Nacional pelo governo militar e ser expulsa do território indígena pela Funai, retornou a São Paulo e organizou um grupo de estudos em defesa da criação de uma área indígena Yanomami. Em 1978, ela publicou o livro “Marcados”, que apresenta uma série de retratos e fotografias documentais dos Yanomami. O livro foi um marco na história da fotografia documental e trouxe a causa Yanomami para a atenção internacional. Entre 1978 e 1992, participou da Comissão pela Criação do Parque Yanomami e coordena a campanha pela demarcação das terras indígenas eluta pelos seus direitos, denunciou as ameaças à sobrevivência dos índios, em consequência do contato com os brancos, e promoveu uma forte campanha ela demarcação da terra indígena Yanomami, o que finalmente ocorre em1992. Entre 1993 e 1998, atuou no Programa Institucional da Comissão Pró-Yanomami.

Publica os livros, Amazônia, em parceria com George Love, pelo editora Pratix, em 1978; Mito poemas Yanomami, pela Olivetti do Brasil, em 1979; Missa da terra sem males, pela editora Tempo e Presença em 1982.Na 24ª Bienal Internacional de São Paulo, em 1998, apresenta imagens de corsépia, com grandes intervenções de luz. Atrai a atenção do espectador sobretudo para os olhares e gestos dos índios. Os retratos são geralmente realizados contra fundo neutro, incidindo sobre eles a luz, como granulação dourada. Em outros trabalhos, coloca em suas fotos a produção de imagens dos próprios Yanomamis, como as pinturas rupestres. Ao analisar a séries de fotografias Marcados, a pesquisadora Stella Senra afirma que o nome de Claudia Andujar está sempre associado ao dos Yanomani aos quais dedicagrande parte de sua obra e vida, “sem diferenciar do registro das imagens oesforço para defende-los das conseqüências do contato com o branco”.

Esse comprometimento além da obra fica evidente na atividade de Claudia como ativista. Em 2005, foi lançado o livro A Vulnerabilidade do ser, pela editora Cosac &Naify. amostra de trabalhos pouco conhecidos da primeira parte de sua carreira. Em novembro de 2015, é inaugurado a Galeria Claudia Andujar, um pavilhão dedicado a suas obras, no Instituto Inhotim, em Minas Gerais. No mesmo ano, foi lançado o documentário A Estrangeira, que retrata sua vida como artista e ativista, dirigido pelo curador de seu pavilhão, Rodrigo Moura. Aos 87 anos, Claudia retorna à Amazônia para conversar com lideranças indígenas locais. Em 2018, recebeu a medalha Goethe, em Weimar, na Alemanha, a condecoração mais alta do país europeu, pelo reconhecimento d oseu trabalho com os Yanomami, ao longo das últimas décadas. “É através da imagem do outro que cheguei a me conhecer e cheguei a entender o amor que nutro pela vida; a angústia de poder penetrar e captar o ser no seu íntimo; uma imagem que acaba de se refletir em mim”.